Roteirista, desenhista, escritor, pintor, escultor e compositor. É com essa faceta multitalentosa que Sávio Christi, 30 anos, se identifica. Dono de uma mente criativa e rica, que é capaz de abordar uma infinidade de temas e gêneros, desde comédias – com sua dupla de pilantras Albert & Einstein – aos dramas eróticos – personificados através de sua personagem Márcia, a Prostituta.
Quem conhece Sávio apenas pela seu ativo e movimentado perfil em redes sociais, com sua atenção aos detalhes, escrita refinada e bem trabalhada, pode estar perdendo um inspirador lado de quem ele é. O lado que supera dificuldades e luta pelo sonho de ser reconhecido pela sua arte e por seus trabalhos.
Foi durante o evento de lançamento de suas obras Albert & Einstein – A Pilantragem e Albert & Einstein – Trapaceiros em Apuros que tive oportunidade de conhecer Sávio pessoalmente e sua mãe, Joan. Foi também durante esse evento, que os dois concordaram em conversar com a equipe doTerra Zero e contar um pouco de sua história.
A busca por uma solução
Desde o começo… Desde os primeiros meses de vida, eu notei que ele era diferente.— Joan, mãe de Sávio.
Um caminho muito longo separa os momentos do Sávio criador, lançando seus trabalhos, compondo e desenhando, e de sua infância, com a luta de sua mãe em busca para entender e melhor se relacionar com suas dificuldades. Sávio passou por uma longa caminhada, entre médicos e especialistas, na busca de tentar entender a condição especial que ele apresentava. A partir dos quatorze meses de vida, Sávio era tratado por seus sintomas, sendo atendido por uma equipe de multiespecialistas que incluíam psicólogo, psicopedagogo, psicomotricista, fonoaudiólogo, arte terapeuta, psiquiatra e neurologista. Ainda assim, nenhum deles possuía um diagnóstico preciso para o menino.
A primeira pessoa a identificar a condição de Sávio foi a pedagoga da escola que ele frequentava. Ela indicou uma outra profissional, também pedagoga, que confirmou o diagnóstico apontado no colégio. Não satisfeita, Joan foi buscar uma segunda opinião.
Eu procurei o melhor psiquiatra de São Paulo. Cheguei lá, Sávio sentou. Ele pegou um papel e falou para o Sávio fazer um desenho. Sávio desenhou. Ele me falou: Seu filho tem Síndrome de Asperger.— Joan, mãe de Sávio.
Lidando com a Síndrome de Asperger
Quinze anos atrás […] ninguém sabia o que era isso, era um bicho de sete cabeças. Tanto é que eu fui em não sei quantos médicos e ninguém sabia.— Joan
Finalmente tendo um diagnóstico, veio uma nova etapa: aprender a lidar com a condição que, nos anos oitenta, era virtualmente desconhecida por quase todos.
O portador de Asperger tem dificuldade de interagir com outras pessoas, apresentam dificuldades motoras e possuem maneirismos excêntricos e repetitivos. Além das dificuldades oriundas da Síndrome de Asperger, Sávio também teve um quadro de meningite com um ano, que deixou sequelas que prejudicaram seus movimentos finos, ou seja, os movimentos delicados da mão. Mais notavelmente, a criança com a condição da Síndrome de Asperger desenvolve um comportamento específico, quase obsessivo, em um interesse único, o que faz deles pessoas excepcionais em suas áreas de interesse.
No caso de Sávio, esse interesse específico é justamente pela arte, em seus diversos aspectos. Isso faz dele um estudioso dedicado em pintura, desenho, música, poesia, escultura, literatura e cinema.
Um histórico de bullying e violência
Meu filho sofreu muito bullying na escola, ele chegou a ser agredido na rua e ter o braço quebrado.— Joan
Foi uma longa jornada para o autor alcançar seu patamar atual. Joan contou que Sávio tinha dificuldade para se relacionar na escola. Na creche, ele permanecia debaixo das mesas, durante todo o período escolar. No ensino médio, não fazia aulas de Educação Física e ficava andando pelo espaço da escola durante essas aulas. Por conta desse comportamento, Sávio sofreu muito bullying na escola, a ponto de ser agredido com violência. As pessoas não olhavam para ele com naturalidade. Até hoje ainda há discriminação, justamente por falta de conhecimento.
Eu vou lutar para que essa Síndrome seja mais aberta. Para que as pessoas saibam a dificuldade e o sofrimento de uma pessoa que tem Asperger. Porque todo mundo respeita autista, porque mais ou menos já sabem o que é. Mas Síndrome de Asperger? As pessoas não entendem um rapaz de 30 anos andando em círculo no shopping, mexendo com as mãos.— Joan
Construindo um sonho e uma carreira
Enquanto conversávamos, Sávio me disse que seu sonho era ser reconhecido por sua arte e seus trabalhos. De fato, muito da jornada que ele vem construindo esta contribuindo para a concretização desse sonho. Os lançamentos de Albert & Eisntein – A Pilantragem e Albert & Einstein – Trapaceiros em Apuros foram sucessos que surpreenderam os vendedores da livraria durante o evento de lançamento (e se deve ser dito que, de todos os eventos de lançamentos a que este repórter compareceu na livraria, nunca havia presenciado um que fosse tão movimentado). O primeiro passo para a coroação dessa carreira foi dado com o convite do FIQ 2015 e o concomitante reconhecimento de sua importância, em um momento no qual a diversidade (ou, como preferimos no Terra Zero, a multiversidade) adquire cada vez mais importância.
É inegavelmente admirável ver a dedicação e o cuidado que Sávio Christi tem com seus trabalhos, seus personagens e suas criações. São estas características que fazem dele uma figura mais inspiradora e surpreendente, um símbolo maiúsculo da multiversidade, tão discutida neste ano e tão necessária em um ambiente criador cada vez mais aberto e livre, como são os quadrinhos atuais.
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